Quando eu era guria lá no interior do Rio Grande do Sul,( e isso já faz algum tempo )tinha duas coisas que eu gostava muito. Uma eram os casórios na campanha ( zona rural) com a casa enfeitada pra receber os nubentes e a parentada,recepcionados com gaita e violão e bóia à la farta e outra quando morria um vivente e o velório era mais que um momento de encontro de gente que não se avistava de há muito, no causo, o morto era o que menos interessava, porque o que corria frouxo era a canha, a pastelama frita, a carne de porco picada, o café preto de chaleira, a roda de mate....
Na realidade o velório virava em festança, uma comemoração... e se bebia o morto até o momento do enterro. Vai daí que nessa engronga toda, a alteração tomava conta, a contação de anedotas arrancava gargalhadas e o defunto ali, bem quietinho, por certo lá do outro lado rindo junto com aquela junção de borrachos e pitadores ao redor do caixão.
Me lembro de alguns desses acontecidos, um deles o velório do Tio Wilson. A família mal mal tinha contato porque o falecido desde guri havia se mandado à la cria por esse mundão de Deus.
Um dia deu com os costados numa cidadezinha perto de Itaqui onde acabou virando artista de circo. Como era um tipo bem apessoado e de fala mansa, chovia de mulher ao redor do moçoilo, mas ele logo se afeiçoou à Rosinha que vendia pipoca antes da sessão começar e depois virava trapezista e com ela o Wilson fez par por um boa temporada.
Vez em quando ele aparecia na terra natal para um "buenas tarde" e um "até mais ver" e sumia por mais um eito de tempo.
Até que um dia chegou a notícia do passamento do Tio Wilson e o falecido junto. Então o alvoroto foi grandioso. As sobrinhas do Wilson se botaram de vaqueanas no cabo da fazedura de salgados e o resto da parentada cada um chegando com um frasco lotado da água que passarinho não bebe, algumas garrafas de gasosa e cirilinha, outros de guaraná crush para facilitar a descida dos fiambres.
E foi tanto o rebuliço que com a chegada de mais gente no acontecimento do dia, porque um velório no interior era motivo de destaque na cidade, que tiveram que arredar o morto prum lado e abrir a mesa farta aos sedentos e esfomeados que chegavam mais era para encher o bucho mesmo!
E o que não faltou foi muita risada, porque de choro nem vela, necas de catibiribas nessa bebemoração!
Até que chegou o tal carro fúnebre. Era uma carruagem dessas puxadas por cavalos que transportavam os caixões com os corpos dos falecidos até o local de seu sepultamento durante um cortejo fúnebre.
Foi aí que a cuerada se deu conta de que não era uma festança e sim um velório, e de pronto desfizeram o cenário e trocaram o riso fácil por uma expressão de tristeza e profundo sentimento.
E lá se foi o Tio Wilson desta vez não para sumir no mundo entre piruetas e acrobacias no picadeiro de um circo de borlantins e sim para o último salto do trapézio da vida agora para o céu dos artistas que com certeza há de ter sim num mundo paralelo pelo menos para aqueles que acreditam que a vida continua pelas plagas de outras dimensões....